O Anticurso Filosofia e Contracultura, elaborado por Luiz Carlos Maciel pouco antes do seu falecimento, foi lançado oficialmente na Casa da Ciência da UFRJ, em 15.03.18, data em que Maciel completaria 80 anos. Ele sabia que não teria tempo para entregar à editora o seu último livro, que se chamaria A Rosa dos Ventos. Preferiu, então, deixar o registro em vídeo desta série que representa, não apenas o seu canto de partida, mas a sua vida e o seu legado.
Nesta aula inaugural Luiz Carlos Maciel (1938 - 2017) descreve as contradições de sua formação intelectual, muito influenciada pelos pais, que tinham visões de mundo bem diferentes: sua mãe era Católica Apostólica Romana; e o seu pai, ateu, materialista e simpatizante do Partido Comunista. Daí, inclusive, a razão da escolha do nome “Luiz Carlos”, em homenagem a Luiz Carlos Prestes (1898 - 1990). Foi por influência de sua mãe que Maciel estudou com os jesuítas no Colégio Anchieta, de Porto Alegre, recebendo uma boa educação religiosa. No Colégio, Maciel era muito instigado pelos padres para a importância de seguir a verdadeira fé, a religião católica. Ali aprendeu a filosofia tomista que fundamenta a Escolástica Medieval mas, tão logo se tornou adolescente, recebeu de presente do seu pai um exemplar do Manifesto Comunista de Marx e Engels. Isto levou Maciel a ler as outras obras destes autores, o que fez com que ele fosse se colocando do lado do povo e se tornando, aos poucos, comunista à sua maneira. Foi de um polo ao outro muito rapidamente: da preocupação com a salvação individual após a morte, passou a experimentar o sentimento de injustiça social e o sofrimento da espécie humana, sujeito ao poder do capital, tal como denunciado pelos marxistas.
Foi por essa época que se deu o suicídio de Getúlio Vargas (1882 - 1954), quando o Terceiro Exército saiu às ruas de Porto Alegre para reprimir as manifestações que passaram a ocorrer imediatamente após o anúncio de sua morte. Estas manifestações, presenciadas por Maciel, o marcaram profundamente. Maciel tornara-se um marxista independente. No entanto, a preocupação com a sociedade e as classes menos favorecidas nunca o fez perder a preocupação com a sua alma. Percebia em si mesmo uma duplicidade de sentimentos, mostrando-lhe que a condição humana ia muito além das injustiças sociais. E foi assim que Maciel acabou descobrindo o Existencialismo, a filosofia da moda do pós-guerra. O Existencialismo tinha o sentido de alertá-lo para as suas limitações. Se ele não era capaz de salvar sequer a sua vida, como salvar a vida das vítimas de injustiça social? Desse conflito interior nasceu o interesse por dois livros, que podem ser considerados o início da sua trajetória intelectual.
O primeiro livro, do espanhol Miguel de Unamuno, chama-se Do Sentimento Trágico da Vida. O livro tem como tese central a afirmação do desejo de todo ser humano de ser imortal. Abominamos a morte. Queremos continuar sendo o que somos, aqui e agora, queremos continuar sendo isso que conhecemos como sendo nós próprios. Queremos a imortalidade pessoal. Como isto é impossível, o sentimento trágico da vida é inevitável. Esta conclusão marcou profundamente o espírito de Maciel, que passou a se sentir como um condenado à morte.
O segundo livro que marcou o início de sua trajetória intelectual foi O Mito de Sísifo, de Albert Camus. O Mito de Sísifo trata do absurdo da condição humana. Este mito grego descreve a punição que Sísifo recebe dos deuses: Sísifo é condenado a empurrar uma pedra pesadíssima até o alto da montanha. Quando a pedra chega ao topo, ela rola montanha abaixo e Sísifo tem que descer a montanha, pegar a pedra e empurrá-la uma vez mais montanha acima. E isto eternamente! Esta é a imagem que Albert Camus expõe em seu livro como a imagem da condição humana. A única pausa no esforço de Sísifo é quando ele desce a montanha. Camus sustenta que é preciso considerar Sísifo feliz.
O impacto destas duas obras é tão grande em Maciel que o leva a fazer o vestibular para Filosofia, quando os seus pais esperavam que ele o fizesse para Medicina, Direito, ou Engenharia. No curso de filosofia teve a sorte de encontrar o professor Gerd Bornheim (1929 - 2002) que o introduziu a outros filósofos existencialistas, dentre eles, Jean-Paul Sartre (1905 - 1980) e Martin Heidegger (1889 -1976), como mostra esta série de depoimentos de Maciel, os últimos de sua vida, que veremos a seguir.
Ver também:
Morre Luiz Carlos Maciel, o guru da contracultura
brahmanirvana....
A Contracultura na América do Sol: O Underground Brasileiro na perspectiva de Luiz Carlos Maciel
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Негізгі бет Aula 1 - Maciel por Ele Mesmo
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